segunda-feira, 22 de março de 2010

A ineficiência da Justiça brasileira – 4


Inconsequencialismo processual

“Vamos arriscar!”, provavelmente deve ser uma das frases mais ditas nos escritórios de advocacia brasileiros. Sim, porque arriscar qualquer coisa, perante a Justiça brasileira, não tem qualquer consequência prática negativa. É a terceira causa da ineficiência, que eu chamaria de inconsequencialismo processual.

Exemplo: acordei de mau humor e resolvo entrar com uma ação pedindo um milhão de dólares (sim, dólares, que fica mais bonito) contra o meu vizinho e seu xixi matinalmente barulhento. Ele terá de contratar advogado, pagar provavelmente uma grana imensa para no final o juiz dizer que eu tenho que suportar o barulho do vizinho (como já era evidente desde o começo).

Mas qual a consequência desta ação nitidamente temerária? Nenhuma para mim. Pedi assistência judiciária alegando (simplesmente alegando) que sou pobre. A jurisprudência me dá razão e não paguei custas. O valor da causa, para danos morais, pode ser inferior ao valor dos danos morais pedidos, conforme também essa sábia jurisprudência. Logo, a sucumbência será mínima e a pena pela litigância de má-fé, que é calculada sobre o valor da causa, também será mínima.

O Judiciário, todavia, terá de julgar mais esta causa. Os oficiais de justiça terão de citar, intimar e intimar novamente. Serão feitas audiências, as folhas serão numeradas, os servidores confeccionarão ofícios. Toda esta trabalheira para uma ação temerária, para mais uma ação de má-fé, que ocupou enorme tempo e dinheiro do Judiciário, justamente o tempo que é necessário para tornar efetivas as demandas realmente importantes.

Penas mais altas para litigância de má-fé, de 1/5 a 100 vezes o valor da causa, que façam o litigante arriscar menos e só propor ações quando tiver real convicção de seu direito, não quando pretender uma roleta judiciária, é outra das necessidades para a maior eficiência da Justiça.

Mas, como já falei em postagem anterior, não basta que se altere a lei (que já prevê penas de litigância de até 21%). É necessário que a mudança venha de dentro e que os juízes se façam respeitar, aplicando efetivamente as penas, coisa que hoje acontece muito raramente.

E vamos ficando por isso mesmo...