quinta-feira, 18 de março de 2010

A ineficiência da Justiça brasileira – 3


O amplíssimo sistema recursal monocrático

No tópico anterior desenvolvi minhas impressões sobre o sistema recursal monocrático e ficou para este tópico explicar o que eu pretendia dizer com a expressão “amplíssimo”.

Amplíssimo, inconsequente e irrestrito são as principais características desse nosso falido processo civil. Mas acredito ser o maior problema a amplitude. Qualquer decisão, seja a mais banal, seja a mais simples, seja a mais corriqueira, pode ser objeto de recurso no sistema brasileiro, como se houvesse um “direito absoluto ao duplo grau de jurisdição”. Vejam que não critico o direito ao duplo grau de jurisdição em si.

“Cite-se”, ordena o juiz, e já tem gente aos milhares defendendo a possibilidade de recorrer desta decisão. “Recebo a inicial” (por exemplo, nas ações de improbidade) e aqui até os tribunais têm recebido recursos neste sentido. Quer dizer, qualquer barulhinho que um pobre juiz faça no processo será alvo de recurso.

Na Justiça do Trabalho, indubitavelmente muito mais efetiva que a Justiça Comum, é exigido depósito recursal, algo tão natural e evidente que soa estranho ver que só lá existe. Se o juiz, depois da instrução (cognição exauriente, lembram?), deu razão ao autor, o requerido só deveria poder recorrer depois de depositar em juízo o valor da condenação ou pelo menos parte dele.

Isso, por si só, já evitaria recursos protelatórios, de que estão cheios, lotados, empanturrados os tribunais. E mais, se o recurso fosse julgado manifestamente improcedente ou houvesse litigância de má-fé, do valor depositado seriam descontadas custas e multas. Não quero fazer deste espaço um chutômetro, mas não é irreal supor que mais de 30% dos recursos deixariam de existir.

Não podemos esquecer também do papel dos tribunais superiores nesta sempre crescente ampliação do nosso já amplíssimo sistema recursal (novamente o problema que vem de dentro). Na interpretação do direito processual civil é extremamente comum vermos os tribunais superiores admitindo recursos que jamais deveriam ser admitidos. O exemplo do valor do dano moral é um deles. O Superior Tribunal de Justiça, tribunal que não tem por função específica julgar os fatos, mas sim unificar o entendimento jurisprudencial nacional, admite recurso especial para discutir – pasmem! – valor de dano moral, valor que é nitidamente atrelado ao fato em discussão.

No direito penal nem se fala. Tudo pode ser resolvido por habeas corpus, ação que é na prática um recurso e para a qual não se cita a parte contrária (Ministério Público) e que, por isso mesmo, tem grandes chances de sucesso. E nestes habeas corpus admitem-se discussões sobre fatos sob o argumento cada vez mais amplo da já “ampla defesa”, que na verdade põe em total desequilíbrio o também falido processo penal.