Quando eu me formei se dizia que qualquer um que quisesse podia ter título de ‘devogado. Tão fácil era entrar e (mais fácil ainda) sair de uma faculdade de direito que só mesmo implorando de joelhos alguém era reprovado.
O fenômeno continua, mas agora se espalha mais adiante.
As faculdades de direito há tempos não preparam ninguém para o exercício do direito, para a prática de qualquer das carreiras jurídicas. Afora faculdades de direito que sonham em ser faculdades de sociologia ou de ciência política, e esquecem de privilegiar em seus conteúdos o direito processual, o direito civil e penal, enfim, o direito mesmo, é impressionante como não se precisa estudar para passar de uma fase para outra. A desculpa dos professores é a de que o “mercado” seleciona e que não podem julgar os alunos pelo que apresentam apenas na prova (e vão julgar pelo quê, então??!!).
Só que o mercado em direito não é tão seletivo assim. Se você montar um escritório de advocacia, vai ter sempre clientes na sua porta. Paguem bem ou mal, mas é certo que você vai ter clientes. E a Dona Maria, que teve o marido preso por tráfico, vai lá te procurar sem ter a mínima ideia de que na faculdade você nem precisou estudar para as provas de direito penal ou processo penal, já que o professor liberou um trabalho em grupo que no final das contas foi copiado da internet. E tanto você quanto o professor sabiam disso!
Daí a segunda desculpa das faculdades é que “hoje não basta um curso, é preciso especializar-se”. E com isso mais grana para as universidades e professores. Mais grana e muito pouco conhecimento a mais...
Sim, porque hoje “especializar-se”, fora o custo financeiro, é uma tarefa meramente de paciência. Paciência para ouvir professores repetirem que a Revolução Francesa foi o marco histórico dos direitos humanos, para repetirem resumidamente e de forma extremamente antididática (ainda o giz e cuspe) boa parte do que já foi dito na faculdade. E com isso vêm surgindo gerações e mais gerações de especialistas, alguns com mais de uma; alguns com três; alguns até com cinco especializações! Ora, especialista em muito assuntos não é especialista, é generalista! Como se, por exemplo, um médico pudesse colocar na placa de seu consultório algo assim:
Dr. Macedo, gastrogeriatralaringolooftalmopulmoosteoneuroortopedista
Dr. Macedo, gastrogeriatralaringolooftalmopulmoosteoneuroortopedista
Não dá, não dá mesmo! Justamente por isso tem alguma coisa errada.
É que, sejamos sinceros. As especializações continuam sendo aulas meramente expositivas, no mais das vezes cansativas, porque condensam em dois ou três dias o conteúdo de um mês inteiro, sem exigência de leituras, sem exigência de provas, sem exigências para com o professor, que em alguns casos ainda ganha uma salva de palmas no final da atividade medíocre que apresentou.
Dia desses soube que um professor perguntou: qual dos três livros da bibliografia vocês preferem fichar? Adivinhem se não foi o livrinho de 40 páginas? E o mesmo professor, depois, perguntou: que espécie de avaliação vocês acham melhor? E, é claro, a nota pelo fichamento é que foi aclamada vitoriosa, depois de o professor informar que daria dez pela simples apresentação do fichamento.
Ficar sentado ouvindo alguém falar evidentemente não é especializar-se, é no máximo relembrar. Talvez no futuro tenhamos cursos de “relembração”.