sábado, 30 de outubro de 2010

Você já parou para pensar no direito penal?


Você já parou para pensar, realmente para pensar, em quais são as funções da pena?

Pense um pouco antes de continuar a ler. Não, não tente repetir o que você aprendeu na escola, não tente citar um ou outro texto que você tenha lido. Não tente fazer bonito só por fazer. Pense, antes de continuar, em qual é (e não qual deve ser) a função da pena no direito penal.

Pense mais um pouco, ainda não foi suficiente.

E aí? Qual a conclusão?

Depois de amanhã eu escrevo a minha aqui.

Mas, por enquanto, pense no seguinte. Por que o ser humano precisa colocar alguém na cadeia por algum tempo quando se comete um homicídio, por exemplo? Quando somos vítimas de um crime, ou alguém em nossa família (imagine seu pai sendo morto por um playboy fazendo racha), por que exigimos uma pena? Por que as mães das vítimas chegam ao fórum chorando e implorando por justiça? E por que saem chorando quando, mesmo condenado no júri, o réu sai livre, leve e solto?

A lei – e a lei penal não é diferente – exprime os desejos de uma sociedade. O jurista deve tentar compreender tão bem o texto de uma lei e seus objetivos quanto os motivos (o fundamento) da lei. Uma lei que manda devolver em dobro ao consumidor tem um objetivo e um fundamento. E uma lei que aplica uma pena de prisão? Será que sei realmente qual é o fundamento de o Código Penal impor uma pena de até 20 anos para quem mata?

Por que o Código Penal não prevê uma pena de frequência escolar? Isso seria suficiente para satisfazer a sociedade? Por que o Código não prevê a pena de morte do sujeito? Isso seria adequado?

Agora pense também no seu vizinho. Imagine se ele, só para te provocar porque você não concordou com ele na reunião de condomínio, todo dia lá pelas seis da manhã, durante dois meses ou mais, ficasse batendo no chão com um martelinho. Qual o motivo de querermos uma pena, nem que seja de serviços comunitários, para o sujeito? Essa nossa vontade tem fundamento, é legítima? Pense nisso e comente aqui. A discussão vai ser boa.

Pois eu acho que, nestes cinco anos de Ministério Público, nestes cinco anos ouvindo a população, ouvindo vítimas, testemunhas e vendo a ineficiência do processo penal, acho que já cheguei a uma conclusão.

Alguém um dia estava com um baita peso na consciência. Devia ser um juiz. Mandou um réu para cadeia e acho que aquilo não era muito legal. Estava se sentindo um carrasco. Daí pensou: por que eu fiz isso, sou um vingador, um carrasco que manda as pessoas para a cadeia?

Não, pensou nosso amigo. Sou um benfeitor. É que a pena tem por função educar, ressocializar, o indivíduo vai mudar. Que bom. E foi dormir muito bem...

Pois eu acho, voltando, que essa linda historinha de a pena ter funções outras que não punir, simplesmente, foi muito bem inventada para nos fazer dormir tranquilos. Enganados que estamos, e com nosso cérebro de papagaio, continuamos repetindo que a pena é boa porque ressocializa, educa, previne, etc.

Só que aí mudamos o foco, olhamos para o lado errado, e, a partir deste conceito errado construímos um edifício capenga, o atual Palace II do direito, o Direito Penal. Tentamos ver o processo penal a partir dessa ótica falsa da ressocialização, tentamos ver o crime, o réu e a pena a partir da ressocialização. E aí tudo desmorona. E vão querer prender o Naji Nahas!!!

Minha proposta é a seguinte: o direito penal existe e encontra fundamento na punição. A punição que queremos, como lenitivo, ao assassino de nosso pai, ao vizinho barulhento, ao homicida, ao traficante, ao corrupto, ao estelionatário. Essa vontade de punir é justamente o fundamento que legitima o direito penal, quer queiramos ou não; quer achemos bonito, ou não. A punição é o legítimo objetivo do direito penal, que só existe para simplesmente punir.

Não me venham com essa de ressocializar e educar porque, se quiséssemos realmente isso, não falaríamos em prisão. Se este fosse realmente um pensamento firme na sociedade não teríamos mães chorando em plenários de júri, não teríamos vítimas indignadas diante de um réu que nega os fatos, não teríamos corruptos com diploma de nível superior e salário de quinze mil (líquido!) por mês.

Não que eu não ache necessária educação e ressocialização. Por favor não me entendam mal. Só que temos que dividir as coisas. Direito Penal é punição. Escola é educação. Convívio social é ressocialização. O que eu proponho é não misturarmos as coisas.

Da mesma forma que um mecânico, quando perguntado sobre o que é um amortecedor, não vai dizer que é um equipamento que faz o carro passar por qualquer buraco sem problemas, a sanção criminal também não é um instrumento para ressocializar o sujeito. O amortecedor simplesmente reduz o impacto; a pena simplesmente pune. Só isso.