Dona Processo, mulher distinta, no alto dos seus cinquenta anos, elegante em seu tailleur cinza escuro e com suas discretas joias de ouro e esmeraldas, ao passear pelo shopping com seu cãozinho encontra a senhorita Efetividade, moça recém aprovada no concurso de promotor, na casa dos 25 anos.
Efetividade, alta, magra, seios fartos, sorri um sorriso colossal, com dentes lindos. Está acompanhada do namorado, um sujeito simpático com um livro grosso nas mãos, que, espiando, consegue Dona Processo entrever tratar-se de um romance francês.
Invejosa, Dona Processo pensa, em milésimos de segundo, o quão besta é alguém ler algo que não seja Direito, perda de tempo, banalidade, coisas de quem tem tempo sobrando.
A senhorita Efetividade olha com admiração para aquela ilustre senhora, a Dona Processo. É sua superiora no trabalho, já passou por diversas comarcas, é do tempo da máquina de escrever, deve saber tudo esta mulher, e que elegância!
Dona Processo logo pensa: quanto desfrute. Nem casados são. Essas modernidades, só incomodam, atrapalham a vida em sociedade. Logo ninguém mais vai querer casar. E que marido tolo, sorridente, mas parece que não tem conteúdo.
Resolvem parar para um café. A conversa fatalmente gravita em torno de trabalho. Dona Processo acha terrível buscar soluções práticas. "Somos juristas, querida, temos que aplicar a lei, seja como for". Efetividade pergunta: "O resultado não importa?". "Olha, o resultado não depende de nós, querida, depende de outros, do juiz, do tribunal, não de nós".
Efetividade, que já trabalhou na iniciativa privada, que ultimamente tem lido sobre administração de empresas e empreendedorismo, em inglês e espanhol, objeta com temor reverencial: "Mas e o nosso trabalho, doutora, não vai sair prejudicado, não vamos ficar sem dar o resultado a quem dele depende?". Dona Processo, deixando uma marca de batom na xícara ao dar o último sorvo no café, termina abruptamente a conversa: "Querida, se o direito está ao nosso lado, nem precisamos fazer muita coisa".
Abraços e beijinhos, discussão sobre quem paga a conta ("deixa comigo, querida"), ambas seguem, uma para cada lado, na vida, no shopping e na evolução do Direito.