sábado, 6 de agosto de 2011

A teoria... na prática

Lá em Floripa tem um lugar chamado Senadinho. Políticos e intelectuais costumavam se reunir na esquina da Felipe Schmidt com a Trajano para - dizem - discutir os destinos da cidade.

Imaginei como seria um Senadinho jurídico. Só intelectuais do direito lá reunidos. Imaginei também que fossem desses intelectuais exclusivamente teóricos.

- Opa, como vai, doutor Frederico, tudo bem?
- Maravilha, doutor Salvair!
- Muito trabalho?
- Sim, um pouco, tenho que terminar mais cinquenta páginas pra esta semana, a editora pediu pressa.
- Ah, eu também estou nessa...
- Mas bem melhor terminar cinquenta páginas do que ter que fazer cinquenta sentenças, né?
- Sim, sim, imagine... meu primo é juiz. Tem que fazer dez audiências por dia e mais uma dúzia de sentenças.
- Vida boa é a nossa. Tudo bem que tem a correria das editoras, dos congressos, a correção das provas dos alunos. Mas, no final das contas, não é tão difícil.
- Ô, nem se compara. Eu mesmo só dou 8, 9 e 10 nas provas. Assim ninguém reprova e eu fico mais tranquilo pra escrever.
- Eu também, coincidência. Falando nisso, bolei uma teoria diferente para aplicar a constituição ao processo.
- Interessante, conta mais.
- Minha idéia é que a Constituição dá o que eu chamo de "supergarantias" ao réu. Logo, ele tem também superpoderes no processo. Para garantir a ampla defesa, ele pode então até mesmo extrapolar o prazo para defesa preliminar. E os recursos devem sempre ser admitidos, afinal, o duplo grau de jurisdição, na teoria, também é uma supergarantia.
- Excelente, vai vender muito livro. Eu mesmo não faço mais livros para juízes ou promotores. Eles mal têm tempo de ler, de tanto trabalho. Além disso, tem muito mais advogado por aí. Lei da oferta e da procura, meu caro!
- Claro, claro, também pensei nisso.
- Mas, me explica, eu que não sou da área penal, não vai ficar muito atropelado um processo que tenha garantias ilimitadas ao réu? Como fica isso na prática?
- Olha, a prática não é comigo. Sou teórico. Nem penso nisso, geralmente. E as garantias, na verdade, são o preço que se deve pagar por viver numa democracia.
- Nossa, que frase linda, vou anotar para uma epígrafe!