terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Embargos auriculares



Tramita no Supremo uma proposta de mudança do regimento interno da corte que estabelece que "nenhum ministro é obrigado a receber parte ou advogado, senão na presença do advogado da parte contrária, ou, quando seja o caso, do representante do Ministério Público".

Para ser aprovada, a mudança, que inclui o artigo 20-A no Regimento Interno do Supremo, precisa ter seis votos favoráveis. Já tem votos suficientes. Até agora, subscreveram a proposta, apresentada por Cezar Peluso, os ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa, Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Carlos Britto.

Ministros como Celso de Mello e Lewandowski, no entando, já declararam que continuarão atendendo advogados sem a parte contrária. Pelo que se sabe, somente Joaquim Barbosa atualmente se nega a receber isoladamente as partes, como faz tradicionalmente a Suprema Corte norte americana e a Câmara dos Lordes inglesa. Mais uma vez, ponto para ele.

A medida deveria ser adotada em todos os tribunais e juízos do país, mas com uma pequena alteração: ao invés de nenhum ministro ser "obrigado a receber", deveria constar a integral "proibição de receber, salvo na presença do advogado da parte contrária ou do Ministério Público". Quem quiser fazer sustentação oral, que a faça em plenário. Chega de "embargos auriculares".

O fundamento é básico: o princípio do contraditório. Ninguém desconhece que um conversê ao pé da orelha pode alterar um julgamento. Isso se realmente se limitar a apenas um conversê. No caso de a parte contrária encontrar-se presente, informações podem ser contraditadas, mentiras podem ser descobertas e, enfim, a paridade de armas será respeitada.

Atualmente o Ministério Público e as partes economicamente mais frágeis acabam sofrendo com a prática corriqueira de escritórios especializados em "lobby" nos tribunais do país. Alguns deles contam inclusive com advogados especializados em "abrir portas" e outros especializados em eloquência jurídica (entendam o que quiserem...).
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Enfocando o jeitinho brasileiro e os embargos auriculares, leia o excelente artigo de Luiz Guilherme Marinoni e de Laércio Becker: A influência das relações pessoais sobre a advocacia e o processo civil brasileiros.
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Uma palhinha do artigo: "Desnecessário lembrar que esses escritórios e departamento jurídicos têm plenas condições de lançar mão de relações pessoais informais com integrantes do Judiciário para fazer valer os interesses de seus clientes. Trata-se, mais uma vez, da rede relacional e do “jeito”, que produziram institutos bastante peculiares, como os famosos “embargos auriculares”, pedidos feitos oralmente no gabinete do juiz, para o que há inclusive previsão legal".