Ricardo Antonio Andreucci
Procurador de Justiça
A possibilidade de monitoração eletrônica durante a execução da pena foi instituída pela recente Lei nº 12.258, de 15 de junho de 2010, permitindo a fiscalização indireta do condenado, em determinados casos, mediante a utilização de equipamento que possibilite sua localização, com indicação de horário e distância, além de outras informações úteis à fiscalização judicial.
Modificando vários dispositivos da Lei de Execução Penal e acrescentando-lhe os arts. 146-A a 146-D, em seção intitulada “Da monitoração eletrônica”, a Lei nº 12.258/10 teve vários de seus dispositivos vetados pelo Presidente da República, constando das razões do veto que “a adoção do monitoramento eletrônico no regime aberto, nas penas restritivas de direito, no livramento condicional e na suspensão condicional da pena contraria a sistemática de cumprimento de pena prevista no ordenamento jurídico brasileiro e, com isso, a necessária individualização, proporcionalidade e suficiência da execução penal. Ademais, o projeto aumenta os custos com a execução penal sem auxiliar no reajuste da população dos presídios, uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso.”
Assim é que o veto a boa parte dos dispositivos da lei fez com que o sistema de monitoramento eletrônico não fosse instituído em sua plenitude na execução penal, trazendo, portanto, acanhada novidade, que, de certo modo, tem o mérito de inaugurar a possibilidade de utilização dessa preciosa ferramenta de controle do condenado durante a execução da pena.
Sim, porque o foco da nova lei foi primordialmente fornecer aos operadores da execução penal meio mais eficaz de controle sobre o condenado em liberdade, nos casos de saída temporária e prisão domiciliar (art. 146-A, incisos II e IV), não recaindo a preocupação do legislador sobre a ressocialização do preso, fulcro do sistema de execução instituído pela Lei nº 7.210/84, possibilitando-lhe o ingresso gradativo no sistema de liberdade total.
A nova lei, em seu texto originário trazia várias hipóteses de utilização de fiscalização indireta por monitoração eletrônica, a saber: no caso de aplicação de pena restritiva de liberdade a ser cumprida nos regimes aberto ou semiaberto, ou no caso de concessão de progressão para tais regimes; no caso de autorização de saída temporária no regime semiaberto; no caso de aplicação de pena restritiva de direitos que estabelecesse limitação de horários ou freqüência a determinados lugares; no caso de determinação de prisão domiciliar; e no caso de concessão de livramento condicional ou suspensão condicional da pena.
Em razão do veto parcial à lei, entretanto, restaram apenas duas hipóteses em que pode ser utilizada a monitoração eletrônica: saída temporária em regime semiaberto e prisão domiciliar.
Nestes casos, concedido o benefício, o condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento eletrônico (que será constituído certamente por pulseira ou tornozeleira – já que a lei não estabelece o meio), ficando ainda ciente do dever de receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica, respondendo aos seus contatos e cumprindo suas orientações, além de abster-se de remover, de violar, de modificar, de danificar de qualquer forma o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça.
A violação comprovada dos deveres acima especificados poderá acarretar, a critério do juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa, a regressão do regime; a revogação da autorização de saída temporária; a revogação da prisão domiciliar; e advertência, por escrito, para todos os casos em que o juiz da execução decida não aplicar alguma destas medidas.
Outrossim, tornando-se desnecessária ou inadequada, ou se o condenado violar os deveres a que estiver sujeito durante a sua vigência ou cometer falta grave, a monitoração eletrônica será revogada.
Deve ser ressaltado, contudo, que a nova lei, em sua redação originária, antes do veto, permitia a vigilância indireta por monitoração eletrônica aos presos provisórios, na medida em que o art. 146-A (vetado) estabelecia a possibilidade de o juiz determiná-la “para a fiscalização das decisões judiciais” referindo-se, ainda, no art. 146-D (não vetado), inciso II, ao “acusado ou condenado”.
Portanto, a fiscalização das liberdades processuais (liberdade provisória e suspensão condicional do processo, por exemplo) não pode ser feita indiretamente por meio de monitoração eletrônica, tendo o legislador pátrio perdido uma excelente oportunidade de inserir essa interessante ferramenta, de vez, no sistema judiciário brasileiro.
Some-se a isso que a recente lei é bem mais acanhada que a polêmica Lei Estadual nº 12.906, de 14 de abril de 2008, que estabeleceu no estado de São Paulo normas suplementares de direito penitenciário, regulando a utilização da vigilância eletrônica para a fiscalização do cumprimento de condições fixadas em decisões judiciais, a qual, inclusive, previa a monitoração eletrônica de condenados por tortura, tráfico de drogas, terrorismo, crimes decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo, além dos crimes de homicídio, latrocínio, extorsão com resultado morte, extorsão mediante seqüestro, estupro, dentre outros.
Por fim, estabelece a nova lei, em seu art. 3º, a obrigatoriedade de regulamentação da implementação da monitoração eletrônica pelo Poder Executivo, somente após o que estará o sistema apto a ser utilizado como importante aliado do juízo da execução.