Está em discussão um projeto da Corregedoria da Justiça Federal para implantar a remissão pela leitura. Artigo recente do Damásio de Jesus demonstrou as primeiras preocupações (clique aqui).
Não sou pessimista, longe de mim! Mas, diante de tantos exemplos de ações semelhantes adquirindo um caráter mais midiático do que efetivamente transformador da sociedade, eu, tal como Damásio, tenho lá minhas dúvidas.
Imagino um deputado discursando na Câmara - e depois se reelegendo - por ter apadrinhado a Lei da Remissão, ou Lei Deputado João:
- Senhores deputados, ler é fundamental, ler é bão demais, ler é tudo. Sejemos humanos com os presos, vamos permitir a remissão pela leitura.
Imagino também, em poucos meses, os pedidos de remissão chegando ao juiz. Redações mal escritas, copiadas umas das outras, sem pé nem cabeça, e o juiz tendo que avaliar se aquilo vale para remissão ou se é só queima de etapa. "Tenho que dar nota para essas redações", pergunta um juiz em ofício à Corregedoria.
Imagino também o nosso sempre imponente Supremo Tribunal Federal, afirmando em outra imponente súmula que "Não cabe ao juiz analisar o mérito da resenha nas remissões prisionais" ou, noutra súmula: "Negativa de remissão pela leitura sem laudo técnico assinado por linguista configura constrangimento ilegal".
Minha imaginação nem é tão fértil assim! Se fosse, eu imaginaria também advogados levando resenhas caprichadas, com "brocardos" e ditos célebres, latinório e conectivos ("de fato", "assim é que", "Inobstante"). Num exercício de muito exagero, eu poderia imaginar advogados e parentes levando para dentro do presídio, nas famosas cartinhas, redações perfeitas, e só restaria ao juiz dar nota dez três estrelinhas. Na manchete de um jornal popular: "Na vagina, levava uma redação para o marido preso".
Imagino também uma matéria especial no Fantástico, com o Zeca Camargo engrossando a voz para dizer de um novo escândalo: presos analfabetos escrevem resenhas aprovadas pelos juízes e conseguem liberdade. Depois lá vem uma câmera escondida mostrando a resenha entrando e saindo livremente pela janela do presídio. E o Tadeu Schmidt sugere trazer ao vivo quem conseguir aprovar três resenhas seguidas, com direito a pedir a música do dia.
Imagino também o Cleiton Conservani num desafio extremo. Cometer um crime, entrar no presídio e sair de lá, com remissão pela leitura, em menos de uma semana, sem nenhum arranhão, mas com uma lágrima nos olhos quando a câmera chega.
É... vai dizer o Cid Moreira no final da matéria. É FANTÁSTICO!