Mais uma vez, mas agora na reta final do Caso do Mensalão, os ministros estão sentindo na pele o que muitos juízes sempre aguentaram calados.
Depois de defesas em absurda litigância de má-fé, depois de pedidos e mais pedidos reiterados, agora os ministros percebem como eles mesmos engessaram a aplicação das penas nos processos criminais.
Para aplicar a pena num crime, por exemplo, de peculato, que tem pena de 2 a 12 anos, sempre achei que o juiz precisasse justificar e aplicar uma pena razoável de acordo com a gravidade. Muito dinheiro desviado? Pena alta. Pouco dinheiro; pena baixa. Réu com nível superior, pena alta; réu com curso básico e sem noção de contabilidade, pena baixa.
Mas, nos últimos dez ou quinze anos (ou mais; eu ainda não era formado), formou-se uma jurisprudência absurda segundo a qual o juiz deve agir mais ou menos como uma calculadora. Para cada "circunstância" negativa, deve aumentar um sexto da pena mínima. E, portanto, o juiz parte sempre da pena mínima. Saiu do sexto, sentença reformada.
E ai do juiz que não justificar detalhadamente tudo. Tem que calcular, justificar, recalcular, e sempre se ater à fração de um sexto. Três circunstâncias aumentaria três sextos ou, para bom entendedor, metade da pena, e assim por diante.
Ontem, no julgamento do mensalão, o ministro Lewandowski entendeu que isso levaria a penas estapafúrdias... Ora, engraçado... Sempre exigiram que fosse assim, que os juízes se ativessem a um sexto da pena e somassem tudo no final. Estupradores foram condenados a centenas de anos de prisão, ladrões a décadas e, agora, que estão sendo julgados engravatados, a regra tem que ser revista? Sei que não é possível sequer comparar, mas será que um estupro lesa mais a sociedade do que uma corrupção como a do mensalão? Por que então Marcos Valério & Cia. Ltda. não podem pegar uma pena centenária. Madoff, nos EUA, pegou mais de cento e cinquenta anos!
Pelo menos pra uma coisa já valeu tudo isso: agora os juízes vão poder citar o Caso do Mensalão como jurisprudência, como referência. Poderão indeferir requerimentos idiotas, poderão calcular a pena de acordo com a gravidade do delito e não com um ábaco; poderão, enfim, ser um pouco mais juízes e menos máquinas de projetar decisões que só valerão depois do segundo grau.